Juiz de Vacaria condena empresa a indenizar auxiliar de limpeza assediada sexualmente

Uma auxiliar de limpeza assediada sexualmente pelo supervisor deve ser indenizada pela empresa de serviços especializados na qual trabalhou. A decisão é do juiz Eduardo Batista de Vargas, da Vara do Trabalho de Vacaria, que decidiu a ação com base no Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). A reparação foi fixada em R$ 20 mil.

De acordo com o processo, durante o contrato de trabalho, entre outubro de 2019 e agosto de 2021, a empregada passou por situações em que o superior se comportou de forma inadequada diversas vezes, inclusive na presença de outras pessoas.

Em seu depoimento, a autora da ação narrou que o chefe passou as mãos em suas pernas, agarrou-a, beijou seu rosto e tentou acariciá-la. Uma testemunha mulher, que também trabalhou na empresa, disse ter sido vítima dos mesmos atos e que o supervisor mandava mensagens com expressões como “coração” e “fofa”. Ela ainda afirmou que foi despedida por não ter cedido às investidas do superior.

Outra testemunha, um colega da auxiliar, confirmou que viu o supervisor abraçando e pegando na cintura de outras empregadas, além de o ter visto acariciando as costas da autora e de outras trabalhadoras. O homem confirmou que o chefe fazia isso com todas as empregadas e que presenciou a auxiliar se queixando do comportamento do superior.

A empresa negou as alegações e qualquer conduta imprópria. Informou que “mantém práticas rigorosas para prevenir assédio, inclusive com canais de denúncia anônimos”. Afirmou que as mensagens apresentadas pela trabalhadora não comprovam assédio; ao contrário, “demonstram um relacionamento afável entre a reclamante e seu supervisor”. 

Para o juiz Eduardo, a consistência dos depoimentos das testemunhas e os relatos da autora indicaram a existência de assédio sexual. 

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“Os fatos narrados na inicial, e provados, são incompatíveis com o dever de garantia pelo empregador de um ambiente de trabalho neutro e psicologicamente saudável”, afirmou o magistrado. “O procedimento do empregador, por meio de um de seus prepostos, violou princípios humanos basilares protegidos pela Constituição Federal, tais como a intimidade, vida privada, honra e imagem”, completou.

O magistrado ainda considerou “particularmente preocupante” a tentativa da empresa de atribuir à empregada conversas inapropriadas que levaram o supervisor ao tratamento “discutível”.

“Este tipo de argumentação perpetua a cultura do assédio ao sugerir que a responsabilidade pelo comportamento impróprio recai sobre a vítima, insinuando que mulheres não podem agir de forma afável ou se vestir de maneira mais descontraída, sob pena, na concepção ultrapassada da reclamada (para dizer o mínimo), de serem as próprias causadoras do ato delitivo”, concluiu o juiz.

Cabe recurso da decisão.

Assédio sexual 

Incluído no Código Penal (art. 216-A), por meio da Lei 10.224/2001, o crime consiste em “constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição se superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício, emprego, cargo ou função”, com pena prevista de detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos. 

Na legislação trabalhista pode constituir-se, também, como “incontinência de conduta”, prevista no art. 482, “b”, da CLT, ensejadora, inclusive, de justa causa do empregador para rescisão do contrato. 

Encontra, ainda, fundamento legal nos artigos 5º, incisos V e X, da CF/88 e ainda artigos 186, 187 e 927 do Código Civil. 

Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero 

Instituído pelo CNJ (Portaria CNJ n. 27, de 2 de fevereiro de 2021Abre em nova aba), destaca a importância de considerar o contexto de desigualdade de gênero.

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O Protocolo foi desenvolvido no contexto das persistentes desigualdades sociais no Brasil, apesar dos princípios igualitários da Constituição. 

Foi criado para orientar a magistratura, visa promover a igualdade substantiva e a equidade, reconhecendo o papel fundamental do direito nesse processo. 

Integrando-se a sistemas internacionais de proteção, o documento adota um modelo latino-americano e segue as recomendações da Corte Interamericana de Direitos Humanos.

O documento aborda a hipossuficiência processual das vítimas, que se refere à desigualdade de poder ou de recursos entre as partes envolvidas no processo. O valor probatório da palavra da vítima é destacado.

Segundo o Protocolo, a vítima muitas vezes se vê silenciada e enfrenta a dificuldade de demonstrar que não consentiu com a violência sofrida. Isso é relevante nos casos de delitos contra a dignidade sexual, nos quais as violações podem ocorrer em contextos privados, sem testemunhas diretas ou evidências materiais óbvias.

Fim do corpo da notícia.

Fonte: Sâmia de Christo Garcia (Secom/TRT-RS). Foto: Tinnakorn/DepositPhotos

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