Operação Sunitinibe prende em SP cinco pessoas por distribuição de medicamentos falsificados contra o câncer no RS
Com o objetivo de desarticular esquema de distribuição de medicamentos falsificados para o tratamento de câncer a pacientes do Rio Grande do Sul, o Ministério Público, por meio da Promotoria Especializada do Consumidor e a Polícia Civil, por intermédio da Delegacia de Polícia de Proteção ao Consumidor, em ação conjunta, deflagraram nesta quarta e quinta-feira, 17 e 18, em São Paulo, a Operação Sunitinibe. O cumprimento das cautelares de prisão preventiva teve apoio do Departamento de Operações Policiais Estratégicas e da Divisão Antissequestro de São Paulo.
Policiais Civis do Dieic/RS e da Divisão Antissequestro de São Paulo efetuaram, durante a operação, as prisões de cinco pessoas na capital paulista. Duas mulheres foram presas em suas residências na Zona Sul da cidade. As outras três foram comunicadas aos investigados no Centro de Detenção Provisória Pinheiros 1, onde estão presos preventivamente desde o dia 17 de março, em virtude de prisão preventiva decretada pela Justiça do Piauí pelo mesmo motivo durante a Operação Sanitatem. Uma mulher com prisão preventiva decretada permanece foragida.
A investigação teve início em fevereiro de 2018, com a notícia de que a Unimed Porto Alegre adquiriu três caixas do medicamento quimioterápico Sutent 50mg (sunitinibe malato), supostamente falsificado, pelo valor de R$ 38,6 mil (mais de R$ 12 mil por unidade), da distribuidora House Comércio de Medicamentos e Produtos Médicos Hospitalares LTDA, que foram distribuídos a três pacientes em tratamento contra o câncer.
Uma das pacientes percebeu características estranhas nas embalagens, tanto primária quanto secundária do medicamento: caixa com erros de português, bula com manchas e rasuras, frascos com fundo raspado. Notou também que o conteúdo das cápsulas estava vazando, além de perceber uma coloração diferente e notar ausência de efeitos colaterais, visto que já havia ingerido diversas cápsulas.
Diante disso, as três caixas foram apreendidas pela Delegacia de Proteção ao Consumidor, que solicitou perícias nos medicamentos ao Instituto-Geral de Perícias e ao fabricante do Sutent 50mg, o laboratório Pfizer.
Os laudos tanto da empresa Pfizer quanto o IGP apontaram inúmeras divergências nos produtos submetidos à analise, tanto na embalagem quanto na composição.
Segundo a Pfizer, na embalagem foram constatados erros na forma de escrita e na pontuação utilizada na caixa do medicamento original. Quanto à composição, os analistas constataram presença de diversos tipos de vitaminas B. Não havia o medicamento sunitinibe malato nos produtos apreendidos, sendo constatada apenas a existência de complexos vitamínicos misturados a outras substâncias sem qualquer eficácia para os tratamentos oncológicos.
O IGP apontou que as gravações realizadas nas caixas, nos rótulos dos frascos, bula e selos de segurança, foram impressos de maneira divergente da amostra padrão. O tamanho dos frascos questionados divergente da amostra original. Nos frascos tampa rosca foi constatado que não havia o lacre de segurança para crianças. Ainda, na base dos frascos, existem evidentes sinais de raspagem de informações obrigatórias para esse tipo de medicamentos, sendo, portanto, falsificados. O Departamento de Perícias Laboratoriais, também do IGP, apontou que o conteúdo dos medicamentos são quimicamente incompatíveis com o material da amostra padrão.
Assim, houve representação pelo Ministério Público e Polícia Civil pela prisão preventiva das seis pessoas, deferidas pelo Poder Judiciário.
Segundo apontam as investigações, a House Medicamentos sucedeu a Milani Comercial Farmacêutica, havendo confusão patrimonial, no estoque e no quadro de sócios e de funcionários dessas empresas. Inclusive funcionavam no mesmo endereço e tinham o mesmo telefone para realizar as vendas dos medicamentos.
Em dois anos, segundo informações de apenas uma plataforma que operacionaliza as negociações entre fornecedores e clientes de medicamentos (hospitais, clínicas e outros estabelecimentos do gênero), de fevereiro de 2016 até fevereiro de 2018, a House realizou a venda de um montante de R$ 3.9 milhões, enquanto que a Milani vendeu pouco mais de R$ 9 milhões para todo o Brasil.
Os valores não se referem apenas às vendas do Sutent 50mg, mas sim de todos os medicamentos comercializados pelas duas empresas. Não se comprovou que tenha havido a falsificação de outros medicamentos, embora não se descarte a possibilidade, tendo em vista que o Sutent 50 mg falsificado foi vendido para boa parte do país, como os estados de Piauí, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Minas Gerais, Goiás, São Paulo, Pernambuco e Paraná.
A Polícia Civil destaca que embora no Rio Grande do Sul não se tenha notícia sobre a morte de pacientes que fizeram uso do medicamento Sutent 50mg falsificado, a PC destaca que no Estado de Goiás, são investigadas quatro mortes de pacientes que usaram a medicação, sendo uma já confirmada, inclusive com pessoas responsabilizadas criminalmente.
O promotor de Justiça da Especializada de Defesa do Consumidor, Alcindo Luz Bastos da Silva Filho, que trabalhou desde o início conjuntamente no caso com a Polícia, destaca a crueldade dessas pessoas ao venderem remédios falsificados para tratamento de câncer. “Além de ser de um medicamento de alto custo para o tratamento oncológico, é totalmente ineficaz, já que continha apenas vitamina B. Lembrando que o câncer é uma doença que pode levar rapidamente os pacientes a óbito caso não tratada a tempo e da forma correta”, disse o promotor.
Os presos em São Paulo responderão pelos crimes de falsificação de medicamentos (crime hediondo com pena prevista de reclusão, de 10 a 15 ano, e multa), crime contra a relação de consumo (de 2 a 5 anos de detenção ou multa) e associação criminosa qualificada (reclusão de 3 a 6 anos).
A Operação Sunitinibe contou com a participação de cerca de 30 policiais civis da Decon/Deic/RS e do DSA/Dope de São Paulo e foi coordenada pelo delegado de Polícia Joel Wagner, do Decon RS.
Operação Sanitatem
No dia 17 de março, a Delegacia de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro do Piauí havia desencadeado em São Paulo a operação Sanitatem, também referente à comercialização do medicamento Sutent 50mg falsificado, que resultou na prisão de cinco pessoas, empresários pertencentes ao quadro societário e colaboradores de empresas do ramo de medicamentos, suspeitos de envolvimento com a falsificação e distribuição de medicamentos falsos para tratamento oncológico. A operação inclusive foi tema de reportagem no último domingo no programa Fantástico, da Rede Globo.