Desde o início das enchentes, no final de abril, a imagem de casas e cidades inteiras atingidas por uma água barrenta, com tons de marrom, foram a marca da catástrofe climática que assola o Rio Grande do Sul. Do Vale do Taquari à região Metropolitana, dificilmente houve alguma região atingida que não tenha registrado um acúmulo de sujeira e lixo vinda pelos rios e lagos. Assim como o curso da água, essa mancha de sedimentos se desloca.
Nos últimos dias, as partículas de terra, argila, areia, esgoto e resíduos chegaram à região Sul do RS. Desde o início da semana, imagens captadas pelo satélite Sentinel-3 e analisadas pelo Laboratório de Oceanografia Dinâmica e por Satélites (LODS), da Universidade Federal do Rio Grande (FURG), aponta que a mancha de sedimentos que se deslocou do Guaíba para a Lagoa dos Patos já está escoando pelo canal dos Molhes da Barra.
Conforme o coordenador do LODS, o professor Fabricio Sanguinetti, apesar da manutenção dos ventos de Sul, em razão da formação do ciclone extratropical nas proximidades da costa do RS, não está ocorrendo o represamento das águas e da mancha de sedimentos. Apesar disso, a “pluma”, como também é chamada a mancha, ainda pode ser vista a olho nu no leito da Lagoa dos Patos. Alguns relatos dão conta de que é possível inclusive observar o limite da água barrenta para a “normal” na lagoa.
“É o sedimento em suspensão que dá essa coloração que a gente consegue visualizar por satélite. A água está transportando uma variedade de materiais advindos do Guaíba e das regiões dos rios afluentes que sofreram com as fortes chuvas, trazendo inclusive detritos maiores, como pedaços de vegetação. Alguns sedimentos afundam mais rápido, outros demoram mais. E são esses que demoram mais para afundar que alcançam maiores distâncias quando são conduzidos pela água”, apontou.
Segundo Sanguinetti, o transporte de sedimentos é uma ação natural, do continente para o oceano. Entretanto, a grande diferença neste caso, e que reflete na imagem registrada pelo satélite, ocorre em função da grande quantidade de chuva que atingiu o RS. “Essa exportação de sedimentos foi muito maior do que se vê em um cenário normal na Lagoa dos Patos”, completou o pesquisador.
Impacto na pesca e na balneabilidade da região Sul
A presença de uma grande quantidade de sedimentos na Lagoa dos Patos também poderá causar impactos para quem exerce atividades em função dela. Sanguinetti explica que a água com sedimentos e resíduos advindos do Guaíba pode estar contaminada. “A gente sabe que há contaminantes e poluentes, como esgoto doméstico, defensivo agrícola e resíduo industrial nestas águas. Parte disso vai ser distribuído ao longo da Lagoa dos Patos”, contou.
O professor reforça ainda que a presença destes contaminantes em determinados pontos da lagoa poderão causar a mortandade de peixes e outros organismos. “Vai haver um desequilíbrio no ecossistema em algumas regiões. A água vai acabar sendo distribuída por toda a lagoa e isso vai justamente causar prejuízos ao ecossistema, tanto na flora quanto na fauna”, afirmou.
Este impacto no meio ambiente da região pode refletir diretamente na economia local, seja dos pescadores que dependem de condições favoráveis nas águas ou mesmo no turismo, em função da balneabilidade da Lagoa dos Patos. “Em muitos pontos, a água já é imprópria para banho. Agora pode haver um aumento na indisponibilidade de pontos balneáveis na região”, finalizou.