Menos de um mês do Dia da Consciência Negra, em 20/11, movimento que recorda as lutas dos negros pelo fim da opressão e da escravidão, uma nova condenação criminal por injúria racial transitou em julgado, em 23/10, não cabendo mais recurso.
O crime ocorreu em janeiro do ano passado em restaurante na Região Noroeste do Estado, durante o passeio de colaboradores de uma empresa. Ao ser apresentada à vítima, estagiária da empresa, a ré, de 66 anos á época dos fatos, teria dito, conforme a denúncia da acusação: “que tu está fazendo aqui? Tu parece haitiana, tu é muito pretinha…”.
Em 1º grau, a mulher foi condenada a pena de 1 ano e 2 meses de reclusão, substituída por prestação pecuniária no valor de um salário mínimo e prestação de serviços à comunidade, além de multa. Após iniciar a execução criminal, em caso de descumprimento, a ré poderá ter a pena convertida em prisão. A ré recorreu ao 2º grau e, por unanimidade, a 1ª Câmara Criminal, do TJRS manteve a condenação.
No recurso de apelação, a defesa da réu alegou que ela fez o comentário em contexto de curiosidade, “que beirou, no máximo, uma indiscrição, a fim de buscar a origem da vítima”. Diz ainda que a recusa ao benefício da suspensão do processo deve-se ao fato de a ré ter convicção de que não praticou qualquer fato com intento preconceituoso ou racista.
Durante audiência, a vítima disse que entrou “em choque” no momento em que a ré fez o comentário. Segundo ela, a mulher teria usado tom pejorativo. Disse ainda que havia várias pessoas no local que presenciaram a situação. Após os fatos, a vítima pediu desligamento da empresa.
O relator do recurso, Desembargador José Conrado Kurtz de Souza, afirmou que da análise dos depoimentos colhidos não se sustenta a versão defensiva. Pontuou ainda que na delegacia a ré referiu ter dito “essa moreninha, parece que veio do Haiti”, enquanto que em depoimento no juízo alegou ter comentado “pensei que ela era haitiana”. Assim, conforme o Desembargador, a versão em juízo perdeu a credibilidade. Para ele, a fala demonstrou a intenção consciente e deliberada de ofender a vítima na sua dignidade.
“Mesmo com todas as eventuais aberturas semânticas que se fizessem possíveis, é inequivocamente ofensiva à honra em um contexto sócio-histórico e jurídico, estando clara a intenção da agente de ofender a honra da ofendida (vítima). A ofendida disse, ainda, que a ré utilizou tom pejorativo em sua fala, que deu a entender que a vítima não poderia estar ali ou que ali não era o seu lugar, devido a sua raça e cor de pele”, afirmou o relator.
Injúria racial
A injúria racial ocorre quando a honra de uma pessoa específica é ofendida por conta de raça, cor, etnia, religião ou origem. Diferente do racismo, que ocorre quando o agressor atinge um grupo ou coletivo de pessoas, discriminando de forma geral. A partir de janeiro de 2023, após a entrada em vigor de um novo regramento que alterou a Lei do Crime Racial, a injúria racial passou a ser considerada uma modalidade do racismo. Com isso, a injúria racial tornou-se também imprescritível e inafiançável.