Caso Rafael: partes expõem suas teses e jurados vão à votação

Encerrada a fase debates, logo após às 21h, o júri do caso Rafael se encaminha para a reta final. O Conselho de Sentença, formado por quatro juradas e três jurados, já está reunido para tomar uma decisão.

Confira a seguir como foi a sustentação das partes. De um lado, o Ministério Público pediu a condenação de Alexandra Salete Dougokenski, acusada pelos crimes de homicídio qualificado (motivo torpe, motivo fútil, asfixia, dissimulação e recurso que dificultou a defesa), ocultação de cadáver, falsidade ideológica e fraude processual. Do outro, a defesa da ré sustentou que o verdadeiro autor do crime foi o pai de Rafael, Rodrigo Winques, e pediu a absolvição dela.

Acusação

O Promotor de Justiça Diogo Gomes Taborda abriu os debates, falando em nome do Ministério Público, que acusa Alexandra Salete Dougokenski pelos crimes de homicídio qualificado (motivo torpe, motivo fútil, asfixia, dissimulação e recurso que dificultou a defesa), ocultação de cadáver, falsidade ideológica e fraude processual.

Para o MP, entre a noite de 14/05/20 e a madrugada de 15/05/20, Alexandra agiu sozinha, matando o filho Rafael, pelo sentimento de dominação que tinha sobre ele (torpe), devido ao uso excessivo de celular (fútil), ministrando no menino dois comprimidos de Diazepam (dissimulação) e, depois, o estrangulando (asfixia). Em seguida, ela levou o corpo até o terreno vizinho e o colocou em uma caixa (ocultação de cadáver). No dia seguinte, ela teria comunicado à Polícia do desaparecimento do filho (falsidade ideológica) e, no decorrer das investigações, passou falsas pistas aos policiais, inclusive, um calendário que supostamente teria uma marcação feita por Rafael no exato dia do seu desaparecimento (fraude processual).

“A verdade é uma só. A verdade só tem uma cara”, disse Taborda. O Promotor falou sobre as diferentes versões dadas por Alexandra para o crime. Primeiro, de que matou Rafael sem querer (homicídio culposo), ministrando a medicação, e que usou uma corda para arrastar o corpo, o que acabou o estrangulando acidentalmente. Depois, Alexandra confessou que, pelo fato de o filho não a obedecer e não parar de mexer no celular, o medicou e estrangulou (homicídio doloso).

“Mãe nenhuma colocaria o corpo do próprio filho no lixo, na casa do lado”, afirmou Taborda, citando os resultados da perícia que apontaram os motivos para o estado de conservação do corpo de Rafael, mesmo dez dias depois da sua morte.

Taborda considerou que, após a segunda confissão de Alexandra, a defesa passou a trabalhar com a tese de que Rodrigo Winques matou o filho. “Não tem cabimento, o Rodrigo passou todo o tempo em Bento Gonçalves”. Ele mostrou um áudio em que Alexandra liga para Rodrigo e conta que o menino está desaparecido; que ele estaria de posse de R$ 200 reais e que era preciso aguardar até a noite. “Não caiam em mais uma mentira sádica de Alexandra. Punam ela exemplarmente”, pediu ele aos jurados.

Ele informou aos jurados que foram conferidos todos os números de celulares atribuídos a Rodrigo e que apenas dois deles realmente pertenciam ao pai de Rafael. E que foi atestado que estes não foram acionados em Planalto ou região próxima. As redes sociais dele também foram analisadas e, às 20h do dia 14/05/20 (data do fato), o agricultor estava em Bento Gonçalves, que fica a 3 horas de distância de Planalto.

O Promotor de Justiça Marcelo Tubino deu sequência aos trabalhos do MP. Ele iniciou destacando que a quantidade de Diazepam dada a Rafael não seria suficiente para matá-lo. E reproduziu em um boneco o que teria sido a forma como a mãe estrangulou o filho, entre 30 segundos e 3 minutos. “Alexandra teve em suas mãos o destino e o futuro de uma criança que estava sob sua guarda”, afirmou. “Ela sufocou esse menino em vida, porque ele não podia nada”.

O MP apresentou fotos e vídeos aos jurados, entre eles, uma reportagem de TV em que Alexandra conta estar aflita pelo sumiço do filho. “Isso é uma entrevista dada por uma mulher aterrorizada, com medo? Alexandra faz qualquer papel que precisar. Ela vai dando a versão de acordo com o que a prova vai possibilitando”.

O representante do MP também mostrou aos jurados os últimos acessos de Alexandra na internet, horas antes do crime. Segundo ele, a ré buscou informações a respeito de ‘Boa Noite, Cinderela’ e assistiu a vídeos pornográficos onde há sexo forçado, inclusive com pessoas usando um saco plástico na cabeça. “Ela assistiu a uma coisa muito semelhante ao que praticou depois. Ela se excitou para fazer isso”.

Também afirmou que a ré é vaidosa, fria e gosta de chamar a atenção. Considerou-a uma “mãe assassina e fria”. “A gente está aqui pelo Rafael. Ele é o ator principal desse caso, Alexandra, não. Estamos aqui para cumprir a lei”, afirmou Tubino. “Alexandra está há muito tempo enganando essa cidade. Se por 10 dias ela enganou 10 mil habitantes, o Rio Grande do Sul, o Brasil inteiro, é muito fácil querer enganar 7 ordeiros cidadãos”, finalizou Tubino.

A explanação seguiu com o Assistente de Acusação, Advogado Daniel Tonetto, que representa o pai de Rafael, Rodrigo Winques. “A acusada esperou que o coitadinho dormisse, pelos medicamentos que ela deu e o matou estrangulado. Pegou uma corda, arrastou aquela pobre criança, como se fosse um dejeto, e por 10 dias o manteve em uma caixa de papelão, como se fosse um saco de lixo”, disse ele. “Enquanto toda a cidade procurava essa criança, Alexandra estava tomando chimarrão, sempre bem pintada”.

“Ela apresentou cinco ou seis versões diferentes, inclusive o pobre do irmão, que é doente”, afirmou. A última versão, é de que foi Rodrigo. “Toda prova testemunhal indica que Rodrigo estava em Bento Gonçalves”, acrescentou Tonetto. O Assistente de Acusação destacou também a carta escrita por Alexandra ao filho Anderson, em que ela diz ter cometido um erro. No dia 21/05/20, ela enviou à Rodrigo uma mensagem perguntando se ele tinha notícias de Rafael. “Mulher fútil, torpe e cruel”, afirmou.

Na réplica, a Promotora de Justiça Michele Taís Dumke reforçou os argumentos da acusação. Ela contou aos jurados que esteve na casa de Alexandra no dia 21/5, quando Rafael ainda estava desaparecido. “Passei no corredor por onde ela arrastou o filho. Naquele momento, ela era uma mãe que estava procurando o seu filho. Era uma mãe sem filho, eu queria ouvir dela”, afirmou.

A Promotora disse que perguntou, na ocasião, se havia algum problema, e ela negou. “Se houvesse qualquer tipo de ameaça, ela poderia ter me contado. Eu teria todos os meios para garantir a segurança dela”, ressaltou.

Defesa
O Advogado Jean Severo sustentou que o ex-companheiro de Alexandra e pai de Rafael, Rodrigo Winques, é o verdadeiro autor do crime.

Afirmou que a ré não tinha motivos para matar o filho e que não contou a verdade desde o início por sentir medo de Rodrigo. Também disse que Alexandra foi forçada pela Polícia a assumir que queria matar Rafael, quando foi interrogada em Porto Alegre.

O defensor argumentou que Alexandra sofreu violência doméstica durante os 11 anos em que viveu com Rodrigo. Afirmou que ela foi criticada por ser uma mãe rígida e organizada, “que puxava pelos filhos”. Rafael era o melhor aluno, afirmou Jean. “Essa moça suportou um monte de coisa pelos filhos”, considerou ele, ressaltando que a ré não tinha motivação para matar Rafael: “É a morte de um filho que saiu dela, que ela amava”.

Disse que ela participou da reprodução simulada dos fatos, mesmo estando debilitada. E também de um novo interrogatório, onde, segundo o Advogado, a Polícia teria constrangido Alexandra a assumir que teve intenção de matar o menino. “‘Eles querem forçar que eu diga que quis matar o Rafa'”, reproduziu Jean.

Ele falou aos jurados sobre o impasse que houve com os Delegados naquele dia: “Aquilo foi tortura. Cárcere privado é o que fizeram com esta moça”. Afirmou que o depoimento foi mal feito e retirado pelo Juízo de 1º grau do processo (posteriormente, em grau de recurso, o TJRS determinou a consideração do material).

Jean Severo disse que, depois disso, chegou a deixar o processo, mas que leu relatos dela, feitos em um caderno onde escrevia um diário para o filho mais velho, e acabou retornando ao caso. Mostrou aos jurados uma conversa em que a irmã de Rodrigo perguntou se “ele tem algo a ver com isso” (com o assassinato de Rafael), e ele respondeu negativamente.

Afirmou que, “não ter falado a verdade num primeiro momento” foi um erro, mas que isso ocorreu por medo que sente de Rodrigo. “As pessoas confessam por medo, para proteger alguém, por já terem sido muito julgadas. Imaginem 11 anos de violência, estupro, armas no corpo, é tudo de ruim que alguém pode sofrer”, afirmou. “Não é estranho que o pai não saiba a data de nascimento do filho?”, questionou o Advogado. “Eu vou dar crédito para qual versão?”, acrescentou.

“Essa moça tem uma pena eterna. Só uma pessoa vai fiscalizar o voto de Vossas Excelências: Deus”, disse ele aos jurados, que pediu imparcialidade ao grupo. “Na dúvida, eu absolvo”, afirmou. “A absolvição é em parte, porque esta moça já foi condenada, ela perdeu um filho”, argumentou o defensor.

“A absolvição da Alexandra é uma oportunidade de reconstruir a vida do filho. Vocês vão estar absolvendo duas pessoas: ela e esse menino”, disse ele, apontando para Anderson, que hoje vive com a avó materna.

Na tréplica, a Advogada Mayara Juppa reforçou o que já haviam defendido anteriormente, que Alexandra era uma mãe zelosa e não tinha motivação para matar o próprio filho. “Mãe que é mãe, não mata”, afirmou. Disse que na escola ninguém percebeu nada de diferente em Rafael, “porque não tinha nada”. Em seguida, o Advogado Filipe Trelles fez um retrospecto do julgamento e focou nos quesitos que serão colocados em votação pelos jurados.

Ao final, uma foto mostrada pela defesa, que seria de Rodrigo em um local diferente do que alegou estar na noite do crime, causou discussão entre as partes. Para os Advogados, isso comprovaria que ele está mentindo.

Fotos DICOM/TJRS

Sair da versão mobile