Mudança climática está transformando indústria do vinho

O aumento progressivo da temperatura da atmosfera do planeta, gerando uma mudança profunda no Clima da Terra – culpa principalmente dos combustíveis fósseis e do desmatamento –, pode redesenhar o mapa da produção de vinho em nível global, as informações são do Climatempo.

Muitas regiões produtoras já são testemunhas de como as mudanças climáticas estão mudando a viticultura por meio do impacto de eventos extremos – incêndios devastadores, ondas de calor longas e intensas, frio inesperado ou acima da média, secas e chuvas excepcionais. As queimadas na França este ano são um exemplo disso. No ano passado, o país já tinha enfrentado uma quebra de safra bilionária devido a uma geada extrema em plena primavera, o que meses depois cientistas comprovaram ter ligação com a mudança geral do clima.

O maior risco que a mudança climática representa para este setor agrícola é a incerteza. Os produtores costumam conhecer bem o comportamento de cada variedade de uva, quanta água cada uma delas precisa, o tempo exato de fermentação, a época certa de cada etapa de cultivo – todos esses parâmetros estão se tornando progressivamente imprevisíveis.

Muda o clima, muda a qualidade

Com a mudança climática, o pH (a medida da acidez ou alcalinidade) de alguns solos produtores está aumentando, e a acidez está diminuindo, afetando a estrutura, a qualidade e a longevidade dos vinhos.

O clima gera alterações fenológicas na uva que afetam sua qualidade, aromas e cor. As frutas podem amadurecer prematuramente, aumentando seu nível de açúcar fora do prazo esperado, criando uma dissociação entre sua maturação alcoólica e sua maturação fenólica, da qual dependem compostos essenciais (taninos, pigmentos, substâncias aromáticas) que posteriormente definem a qualidade e as características específicas do vinho.

Terras altas, risco elevado

Uma das formas que os viticultores estão encontrando para driblar os efeitos do aquecimento global é plantar em altitudes mais elevadas. Nenhuma regra rígida limita a altitude em que as uvas podem ser plantadas, mas, em geral, essas regiões eram consideradas inóspitas para o cultivo de uvas para vinho.

A adaptação a novas altitudes depende do clima da região, da qualidade da luz, do acesso à água e da natureza da uva. Na Espanha, os produtores da Famíla Torres passaram a cultivar vinhedos em altitudes de quase 2 mil metros nas bordas da Cordilheira dos Pireneus, local impensável para a viticultura espanhola nos séculos anteriores. Regiões elevadas, particularmente nas encostas, têm geralmente solos mais pobres, menos água disponível e mais exposição a eventos climáticos inesperados, como geadas e tempestades de granizo.

O pioneirismo em desafiar as alturas para produzir vinho começou na Argentina, onde vinícolas foram instaladas na Cordilheira dos Andes a mais de 3 mil metros de altitude na década de 1990 – até hoje são as mais elevadas vinícolas do mundo. Embora a experiência argentina não tenha relação com a atual crise do clima, ela lançou as bases para produtores do mundo inteiro que agora olham para o alto em busca de novas terras mais frescas.

Novas regiões produtoras

Além de altitudes mais elevadas, a produção de vinho também está se expandindo para países frios onde antes era impossível cultivar uva própria para vinho. A Inglaterra é exemplo. Há 30 anos, era impensável que qualquer parte daquele país pudesse produzir vinho espumante. A mudança no clima na Ilha da Grã Bretanha permite agora uma já consolidada produção nas regiões de Kent, Hampshire, Dorset e Cornwall.

Bélgica, Suécia, Dinamarca e Noruega também estão vendo esta tendência em seus territórios, assim como partes do Canadá. No Hemisfério Sul, Chile e Argentina estão levando a produção para cada vez mais perto da Patagônia.

Essas produções ainda são bastante experimentais, servem principalmente para selecionar variedades de frutas mais resistentes ao frio extremo e muitos investimentos em pesquisa e tecnologia ainda serão necessários para consolidar vinhedos nesses locais. Ainda assim, são um exemplo concreto de como o mapa da viticultura está migrando – oportunidades para algumas regiões, perda de empregos e riqueza para outras.

Menos sol, please

O senso comum de que as parreiras gostam de sol intenso está sendo desafiado agora que o calor inclemente acaba por matar os vinhedos. No Hemisfério Sul, as terras mais buscadas sempre foram aquelas com a face voltada para o norte, e o contrário é verdade para o Hemisfério Norte. Essa regra agora está sendo relativizada na Austrália, Califórnia e toda a região do vale do Douro em Portugal.

A produção de vinho sempre foi complexa, e a mudança do clima está tornando isso ainda mais verdadeiro. Enquanto negacionistas – muitas vezes financiados por indústrias poluidoras – tentam convencer a sociedade de que a mudança climática é mentira, as indústrias correm para sobreviver sob um clima que já é diferente agora e continua mudando rapidamente.

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