Especialistas avaliam que aumento de contaminações pode ser início de nova onda de covid-19

O Rio Grande do Sul tem visto um aumento significativo de casos confirmados de coronavírus nas últimas semanas. Tanto que o governo emitiu Avisos para todo o estado. Esta semana, escolas municipais da Capital e estaduais de diversas cidades suspenderam suas atividades por conta do elevado número de professores que contraíram o vírus. Para especialistas essa elevação faz parte de uma nova onda da pandemia. Com a chegada do frio no território gaúcho, reforçam a necessidade do uso de máscaras em ambientes fechados, assim com os demais cuidados, como a ventilação.

“A pandemia não acabou e não sei quando vai acabar. Logo vamos ter novos surtos, tem novas variantes chegando”, destaca o presidente do Conselho Estadual de Saúde (CES), Cláudio Augustin. Após ficar internado por nove meses por conta da covid-19, Cláudio segue acamado e se recuperando. “Eu estou na cama e todas as pessoas que entram aqui são vacinadas e vêm com máscara. Eu peguei covid em casa. O grau de transmissão da ômicron é muito elevado e tem novas variantes a cada dia”, conta.

Para o presidente do CES, o agravamento do número de casos de covid no estado deve-se à falta de uma política de prevenção, bem como à liberalização e flexibilização em relação ao uso de máscaras. “Aqui as ações já terminaram, liberaram as máscaras, liberaram tudo. E com isso nós vamos ter novo crescimento da covid, novas internações, novas mortes. Não há motivo algum para reduzir o uso de máscaras e liberar seu uso. Isso simplesmente vai aumentar novamente o adoecimento e as mortes.”

Na mesma linha, o médico pediatra Alexandre Bublitz aponta que países onde houve um afrouxamento de uso de máscaras e outras medidas tiveram aumento de casos da variante ômicron. “O que é algo esperado que fosse acontecer. Quando a gente retira as medidas de segurança, a tendência do número de casos é aumentar. A covid obviamente está bem mais controlada. Nesse momento a pandemia está em um momento diferente do que a gente teve nos anos anteriores, mas ela não acabou ainda. Continuamos tendo alto número de casos no mundo todo e continuamos tendo óbitos todos os dias”, comenta.

Casos poder ser maiores do que os registrados

O número de casos de covid no estado podem ser bem maiores do que os registrados pela Secretaria Estadual de Saúde (SES), isso por conta da subnotificação. “Tem muita gente que não está testando mais, e também tem os autotestes. O que sabemos é que tem havido um aumento de casos que começou na semana passada e se refletiu nas internações”, explica a reitora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), Lucia Pellanda.

De acordo com a SES, a taxa de ocupação de leitos de UTI no estado está em 69,6% nesta sexta-feira (20). Os leitos SUS estão com 64,9% de ocupação e o sistema privado 81,4%. Encontram-se em leitos de UTI 109 pacientes com covid-19 confirmada e 65 com suspeita da doença em todo a rede hospitalar.

Alexandre Bublitz destaca que ainda não ocorreu um aumento significativo em relação às UTI, contudo esse quadro pode mudar. “Apesar de estarmos tendo um aumento geral do número total dos casos de covid, ainda não influenciou para termos um número expressivo no número de internados em UTIs no nosso estado. Isso pode vir acontecer nas próximas semanas”, alerta. Segundo explica o pediatra, normalmente quando se tem um aumento do número total de casos, costuma demorar cerca de três a quatro semanas para o aumento refletir em casos graves.

Chegada do frio e impacto nos casos

Além da redução dos cuidados com a doença, Alexandre ressalta que a situação de agravamento também se dá por conta da chegada dos dias frios. “Com a chegada do inverno todas as doenças infectocontagiosas, respiratórias, tendem a aumentar. O vírus da gripe, influenza, que a gente acaba tendo um número maior de quadros, ele se dá por condição do clima e as condições de circulação desse vírus”, exemplifica o médico.

Ainda segundo ele, o aumento dos casos de outras doenças infectocontagiosas faz com que as pessoas não façam o teste para covid, por acreditar se tratar de uma gripe. “Elas acabam não se testando, não se isolando de forma correta. Muitos continuam trabalhando, achando que estão com apenas uma gripe mas que, na verdade, é covid. Além de mascarar os dados, de diminuir o número total, isso faz com que o vírus se espalhe mais pela população”, complementa Alexandre.

Cláudio Augustim comenta que, historicamente, no inverno, as UTIs ficam abarrotadas em decorrência dos problemas respiratórios. Para ele, com o crescimento da covid, é provável que se tenha colapso do sistema logo adiante. “Portanto tem que se evitar essa liberalidade inconsequente e tem que retomar sim o uso da máscara, criar barreiras sanitárias, fazer tudo aquilo que se fala desde o início da pandemia e que os governos não tem feito”, aponta.

O presidente do CES frisa também que não se pode esquecer das pessoas que estão sofrendo com as consequências da doença. “Temos centenas de milhares de gaúchos que não estão tendo a devida assistência para se recuperar de fato da contaminação da covid. Esse ato do governo do estado de liberar as máscaras é mais um ato genocida praticado de forma irresponsável”, ressalta.

Nova onda da covid

Na avaliação de Lúcia Pellanda, o aumento de casos é o começo de uma nova onda da pandemia e que não se sabe que impacto ela terá. A previsão é que seja menor que as ondas anteriores. “Se imagina que o impacto vai ser menor em termos de internações e óbitos. Contudo, se a gente deixa a transmissão correndo solta, daqui a pouco pode se perder o controle de novo em termos de sobrecarga do sistema de saúde”, pondera. A reitora enfatiza que assim como a covid-19 é um problema complexo, sua solução também é complexa.

“Ao mesmo tempo que todo mundo volta 100% para o presencial, também liberar a máscara é uma coisa muito ruim. É bom primeiro voltar, aguardar um tempo para depois se reduzir os cuidados. A gente pode fazer tudo, trabalhar, sair, ver os amigos, desde que se mantenha os cuidados. Fazer tudo é reduzir os cuidados é um contrassenso”, afirma, usando como o exemplo o caso das escolas onde tem se observado surtos e suspensão de aulas.

Papel da vacinação

Cerca de 79,7% da população residente no Rio Grande do Sul está com o esquema vacinal primário (duas doses) completo, mas apenas 50,4% tomou a dose de reforço, completando o esquema vacinal. De acordo com a SES, do público infantil, de cinco a onze anos, 59,4% recebeu a primeira dose e 32,3% está com o quadro vacinal completo.

Alexandre afirma que o número de pessoas com a dose de reforço ainda está muito baixo. “Em torno de 40% da população gaúcha não fez esse reforço, que é necessário, tendo em vista que ele aumenta o número de anticorpos circulantes dentro do corpo da pessoa. Isso garante uma resposta imunológica mais imediata caso a pessoa venha a ter contato com o vírus da covid”, explica, destacando a baixa cobertura vacinal no público infantil, tanto as que já tem acesso à vacina, ou seja, aquelas acima de cinco anos, como aquelas que ainda não tiveram a liberação.

“É importante lembrar que muitas crianças ao redor do mundo com menos de cinco anos estão sendo vacinadas, e aqui no nosso país isso ainda não acontece. O Butantan já liberou estudo demonstrando a eficácia e a segurança da vacinação com crianças menores de cinco anos, entretanto a Anvisa ainda não aprovou o uso da vacina nessa faixa etária. Isso tem incomodado bastante a comunidade pediátrica”, afirma o médico.

Ele destaca que mesmo que as crianças não tenham quadros tão graves, elas são potenciais vetores da transmissão. “A gente sabe que nessa época do ano muitas crianças ficam gripadas e acabam pegando infecções respiratórias, uma dessas infecções pode ser a covid. E ao pegar essa doença no colégio, ela pode contaminar as outras crianças e levar isso para as famílias”, complementa Alexandre.

O especialista reforçam que ainda é necessário o uso de máscaras, em especial em ambientes fechados, a precaução com higienização das mãos e o cuidado para manter os ambientes ventilados mesmo no inverno. “Conseguindo controlar todos esses fatores e ampliando a vacinação, sobretudo nos grupos de risco, isso tudo diminuiria o número total de caso e evitaria um novo agravamento da covid”, finaliza.

Informações Brasil de Fato.

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